OSTROGORSKI

domingo, 3 de maio de 2009

Reflexão Crítica sobre os Recursos Educacionais Abertos (Cont.)

Como principais pontos fracos, e de entre os vários que poderão ser equacionados, optamos por referir:

1. o facto de o sistema de controlo de qualidade dos conteúdos destes REA não ser fidedigno, e assentar, sobretudo, naquilo que poderíamos designar, como a aposta no pressuposto de que a generalidade dos indivíduos/organizações actua com base nos princípios da responsabilidade (individual e colectiva), na prossecução do bem-comum, na perspectiva liberal smithiana assente no princípio da mão invisível - se eu for simpático com os outros, os outros responder-me-ão/actuarão para comigo na mesma linha (se isto for extrapolado para a escala global, o problema quer da ineficiência, quer da ineficácia estaria resolvido na origem);

2. o facto de este modelo global de acesso aberto fazer assentar o seu argumento-chave na invocação da eficiência como unidade de comparação com outros sistemas. Mas, a verdade é que, mesmo considerando que para efectuar uma análise comparativa, temos que encontrar um termo comparativo adequado, a questão fundamental nesta questão, parece-me ser a da eficácia. No que se refere a um sistema de Educação, a principal preocupação prende-se com os resultados. (...)
Quantos alunos obtêm aproveitamento e quantos têm que repetir? E com que média? Mais do que obter 100% de aprovações, o que me interessa verdadeiramente, enquanto professora, é que aqueles que passam sabem, verdadeiramente, o que é suposto saberem. Não me interessa um sistema que passe todos, numa linha de "porreirismo nacional". Porque o facto é que, depois, quando chegam ao mercado de trabalho (se é que ele subsistirá, e seja em que moldes for), terão que mostrar o que valem...;

3. o facto de considerar que a informação e o conhecimento são bens públicos, quando isso entra em colisão com alguns dos direitos fundamentais do indivíduo, nomeadamente a propriedade intelectual.


No que se refere às ameaças, podemos considerar, por exemplo:

1. o facto de o argumento apresentado para justificar o modelo de livre acesso assentar no facto de a utilidade de liberdade de acesso a um determinado bem/serviço, justificar a violação de um direito legalmente consagrado. Do ponto de vista da organização sócio-político-legal, parece-me um precedente perigoso, na medida em que abre precedentes que poderão vir a questionar outros princípios até aqui consagrados e protegidos por lei - e, tal como sucedia com John Stuart Mill, podemos regressar ao tempo em que práticas como a escravatura, a pena de morte ou as punições físicas em público poderão regressar por se considerar que a sua utilidade social/colectiva é superior aos direitos, liberdades e garantias dos indivíduos...;

2. o facto de, no limite, o open course ware poder funcionar como uma forma mais complexa eficaz de soft power. Na realidade, se tivermos em conta que este sistema de REA assenta na existência de tecnologia, quer no que se refere a hard quer a soft; que estratégias de open course ware que têm vindo a ser postas prática desde 2000 (caso MIT) através da disponibilização dos conteúdos de cerca de 22 disciplinas online, que já foram traduzidos para várias línguas (de entre as quais o português) e que os principais consumidores são os países em vias de desenvolvimento (ao que parece, sobretudo, porque se torna mais barato aprender através deste meio, do que através de livros) quer do continente africano, quer asiático, não é difícil equacionar aqui a prossecução de uma estratégia cultural dominante por parte dos EUA, na linha daquilo que tem sido prática comum, sobretudo desde o final da II Guerra Mundial, e em muitos outros domínios;

3. o facto de caminharmos, com alguma celeridade (maior do que a desejável) para um potencial pensamento e método científico único, na medida em que se o mainstream tender a afunilar excessivamente, podemos deixar de ter margem de manobra para divergir. Note-se, aqui como em relação a Bolonha, por exemplo, que não podemos deixar de referir a existência de uma clara e marcada influência supranacional que, inicialmente, é sempre de carácter Global. Neste caso dos REA, ela partiu da UNESCO em 2002. Mas, em relação a Bolonha também já tal havia sucedido...

No que se refere às oportunidades, salientamos, por exemplo:

1. o facto de uma das preocupações mais salientadas em todos os recursos de apoio ao desenvolvimento da actividade que consultámos, se relacionar com a qualidade dos conteúdos e das ferramentas a serem disponibilizadas online;

2. o facto de os conteúdos poderem ser reutilizados, o que pressupõe uma actualização e adequação estrutural e conjuntural (mais do que meramente individual), bem como a potencial aposta na inovação de métodos e processos de ensino e aprendizagem;

3. o facto de permitir construir um ambiente de ensino e aprendizagem mais versátil e, simultaneamente, potencialmente mais motivante para os vários intervenientes - o que, e assegurando sempre a exigência necessária e a qualidade, pode vir a traduzir-se (ainda que relativamente) em melhores resultados (quer no que se refere a números de aprovações em termos absolutos, quer no que se refere às classificações).

Por isso, a grande questão passa, como semprte, por balancear os prós e os contras por forma a fazer a escolha mais racional possível, potenciando custos e benefícios em função dos resultados definidos.

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3 Comentários:

Blogger Unknown disse...

(...)(caso MIT) através da disponibilização dos conteúdos de cerca de 22 disciplinas online(...)

Olá Sandra

O MIT já disponibilizou mais de 1800 disciplinas online! É difícil pensar num assunto para o qual não exista lá um curso :-)

5 de maio de 2009 às 03:36  
Blogger Sandra B disse...

Este comentário foi removido pelo autor.

5 de maio de 2009 às 16:13  
Blogger Sandra B disse...

Caro João,

Obrigada pela actualização dos dados :)
Penso que a referência a essas "tais" 22 cadeiras dizia respeito à fase de arranque da experiência MIT... (Ou terei percebido mal?):)

5 de maio de 2009 às 16:15  

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